12 abril 2010

Luz do dia

O corpo é o túmulo da alma.
Sintetizei e traduzi. Tudo e todos existentes aqui dentro de mim, condensados num único ponto: prisão. Não, deslizar a lâmina sobre o meu corpo, rachaduras voluntariamente feitas, não faz desejos escorrerem. Perderem-se. Livrar-me. Sangro durante algum tempo. A dor fina com punhal, me faz esquecer um pouco da inquietação constante. Necessidade de me satisfazer.
Já tentei encher a barriga dessa besta. Logo depois da digestão e do conseqüente mal-estar cravado na alma, ela quer mais. Não se satisfez por completo. Tenho a certeza disfarçada de sensação, para não me apavorar tanto, ser essa fome insaciável. Pergunto-me não estar eu me transformando em escrava de mim mesma. Sinto agonia pelo tempo futuro. Uma tarefa digna às Danaides. Poço sem fundo. Encho, encho, encho.
Fome.
Os estímulos me atormentam. Eletrecutam-me. Logo após a sonolência esperada pelos choques, empurro as paredes internas a fim de me misturar a eles. Uma coisa somente: eu e os cheiros... gostos... superfícies... sons... cores... Tudo, um. Ser constantemente aguçada. Explodir. E, novamente, outra explosão. Mais uma. Outra.
Preciso disso. Prazer. Não, não há mal na palavra. Gozo ao sentir o verde do lodo entrar buceta adentro, substituindo o fluido vermelho por algo mais viscoso. A terra enchendo-me a boca. O gosto dos pequenos grãos... a saliva barrenta escorre queixo abaixo... Sujo-me.
Preciso me sujar. Não é sujar. Minha carcaça é alvo fácil à moral dos outros. Bombardeiem-me. Atirem-me. Quanto mais esfacelada, mais vejo a luz do meu dia. Vejo a porta de entrada a uma outra prisão na qual fiz questão de estar reclusa. Não vivemos tão por si próprios. Indignem-se contra a minha sujeira (assim são vistos meus desejos dentro da cela de vocês) e permitam chafudar-me nela.

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